17Jun
Medida beneficia 53 países africanos e redesenha o tabuleiro do comércio internacional

Durante o Fórum de Cooperação Econômica China-África realizado em Changsha em junho de 2025, a China anunciou oficialmente a eliminação total de tarifas alfandegárias sobre produtos provenientes de 53 países africanos, com o objetivo declarado de “reforçar o comércio justo, equilibrado e mutuamente benéfico”. A medida entra em vigor no segundo semestre deste ano e inclui produtos agrícolas, minerais, tecidos, produtos alimentares e manufaturas básicas.

O que a China oferece?

Além da isenção de tarifas, o governo de Pequim comprometeu-se com:

Linhas de crédito preferenciais para países africanos com alto índice de exportações;

Apoio técnico à industrialização leve;

Investimento logístico em portos e estradas, para acelerar o escoamento de produtos;

Capacitação tecnológica em setores como agricultura, mineração e energias renováveis.

A medida foi aplaudida por representantes de países como Nigéria, Angola, Quênia, Etiópia e África do Sul, que veem nela uma abertura concreta ao mercado asiático, sobretudo num momento em que o Ocidente impõe regras comerciais mais rígidas e políticas protecionistas.

Quais são os riscos?

Apesar da aparência vantajosa, analistas alertam para riscos importantes:

Desindustrialização africana: a entrada facilitada de produtos africanos brutos pode reforçar a lógica de exportação de matérias-primas e importação de bens processados o mesmo ciclo do colonialismo;

Endividamento estratégico: as linhas de crédito e construção de infraestrutura podem converter-se em “armadilhas da dívida”, como ocorreu em países da Ásia e do Pacífico;

Dependência comercial assimétrica: a África exporta majoritariamente bens de baixo valor, enquanto importa produtos de alto custo da China.

Além disso, poucos países africanos têm capacidade de transformação industrial para aproveitar plenamente o benefício tarifário. Sem industrialização interna, o continente continuará sendo fornecedor de recursos, e não protagonista do comércio global.

Um novo eixo de influência?

A decisão da China também tem leitura geopolítica. Em tempos de disputa com os EUA e a União Europeia, Pequim consolida a África como seu parceiro estratégico não apenas em termos comerciais, mas políticos, militares e diplomáticos. O comércio, nesse contexto, é também uma ferramenta de influência.

Países africanos celebram a parceria, mas é essencial manter cautela, soberania e visão estratégica. Benefícios reais só ocorrerão se os Estados africanos negociarem com inteligência, exigirem transferência de tecnologia e priorizarem o valor agregado nacional.

Reflexão final

A isenção tarifária anunciada pela China representa, sem dúvida, uma janela histórica de oportunidade para África. Mas toda abertura exige estratégia. Sem políticas públicas fortes, sem investimentos na transformação local, sem autonomia de decisão, o que parece um presente pode se tornar um novo ciclo de dependência.

A pergunta que fica não é o que a China dá mas o que África decide fazer com isso.