09Mai
No coração de Moscovo, Vladimir Putin reuniu novamente os olhos do mundo. Mas desta vez, os focos estavam voltados não apenas para o cerimonial da vitória sobre o nazismo, mas para os rostos africanos presentes ou representados na festa do Kremlin. A simbologia é poderosa, mas também reveladora. Por que Putin escolhe este momento, no auge de sua confrontação com o Ocidente, para estender a mão à África?

 

Putin sabe o valor dos símbolos. Convidar chefes de Estado africanos para uma celebração marcada pela memória da resistência e do poder militar é uma estratégia calculada. Ele constrói narrativas — não apenas alianças. E, ao fazê-lo, reposiciona a Rússia como um parceiro “resistente ao imperialismo”, um eco direto das antigas lutas de libertação africana apoiadas pela União Soviética.

 

Mas há mais do que memória. A Rússia está, hoje, isolada das grandes economias ocidentais, sancionada, limitada em suas trocas comerciais tradicionais. A África, nesse contexto, representa mais do que simpatia: representa mercado, apoio diplomático nas Nações Unidas, recursos estratégicos, legitimidade internacional.

 

Os líderes africanos, por sua vez, enfrentam dilemas complexos. Devem acolher esta aproximação com entusiasmo? Devem desconfiar de um novo ciclo de dependência? Ou devem, com sabedoria, usar essa janela para negociar com firmeza em nome dos seus povos? O risco não está na aliança com a Rússia, mas na ausência de uma visão africana forte, soberana e estratégica.

 

Putin é mestre em criar pontes com quem se sente esquecido. E muitos africanos, cansados das promessas ocidentais não cumpridas, veem na Rússia uma alternativa possível. Mas é preciso que a África negocie de igual para igual. Que diga sim quando for vantajoso e saiba dizer não quando for necessário. O futuro da cooperação russo-africana não pode ser uma reprodução das velhas relações coloniais, apenas trocando a bandeira dominante.
Conclusão:
A festa de Putin não foi apenas uma celebração de glórias passadas. Foi uma mensagem direta ao mundo: a Rússia ainda sabe fazer diplomacia com propósito. E a África, mais uma vez, está no centro da disputa. Cabe aos líderes africanos perceberem que a dança com Moscovo pode ser elegante, mas precisa ser conduzida com os pés firmes no chão da realidade africana.
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